17ª Festa Literária Internacional de Paraty 16/07/2019
Posted by Maria Elisa Porchat in Atualidades, Literatura.Tags: diversidade, Euclides da Cunha, Flip, Liberdade de expressão, Os Sertões, polarização política
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O sertão virou Flip. A Flip virou sertão.
Em parte. O trocadilho vale de certa forma, porque entre todas as Flips a que compareci, essa foi a que trouxe mais o homenageado para dentro da programação, no caso Euclides da Cunha com sua obra Os Sertões. Estava nas falas dos palestrantes, no título das mesas com nome de rios, vilarejos e até um meteoro da região, na programação de filmes e músicas. Por outro lado, o que mais marcou essa Flip não foi o sertão, mas a diversidade. Diversidade de público , de espaços culturais e de entretenimento.
Meu resumo será dividido como Os Sertões em : A Terra ( Paraty nesses dias), O Homem ( as pessoas em destaque ) e a Luta ( palestra de Gleen Greenwald, da Intercept). Desculpe, Euclides.
A Terra
Paraty fez jus ao reconhecimento pela Unesco de Patrimônio da Humanidade por sua biodiversidade e pela riqueza de sua cultura. As ruas nunca estiveram tão lotadas, por pessoas com perfis dos mais diversos, unidas apenas pelo entusiasmo e pelo interesse em se entreter, aprendendo. Havia filas enormes – para palestras, para autógrafos, para restaurantes.Nunca foi tão difícil andar pelas pedras tortas com aquela multidão, não só de visitantes mas de artistas da região, indiozinhos que cantavam, poetas que declamavam, músicos com instrumentos variados e ambulantes que vendiam artesanato e doces caseiros . Não importava que o barulho do artista atrapalhasse a audição de uma palestra transmitida pelo microfone na rua lotada.Todos tinham direito ao espaço. Ouvi dizer que a Flip , em suas primeira edições, foi uma festa elitista, mas hoje é festa de todos e todas, como faziam questão de frisar os palestrantes, ao dizerem :” Boa tarde, todos e todas”.
A oficial Tenda dos autores , a única programação paga, teve seu espaço reduzido e lotado, em contraponto às filas enormes para as programações gratuitas.Neste ano foram inúmeras e excelentes as atrações culturais paralelas, promovidas por parceiros da Festa Literária. Cito como novidade para mim, o caminhão Conflitos montado pela Universidade Federal de Minas Gerais e Instituto Moreira Sales, com fotos e vídeos sobre os principais conflitos da história do Brasil; a programação audiovisual do Sesc, a Casa Para Todos , o barco da Flipei ancorado no Pontal, sem falar nos espaços que já conhecia, como a Casa da Cultura, onde assisti a uma palestra sobre Dom Pedro I e a Casa Folha com palestras que congestionaram a rua do Comércio. À noite, o Cinema na Praça, passou filmes nacionais como Deus e o Diabo na Terra do Sol, Cabra Marcado para Morrer e outros. Muitos outros espaços culturais havia, que não deu para visitar.
A Terra Paraty esteve o tempo todo esplêndida, com céu limpo e a lua crescente fazendo seu reflexo na água do canal. Um encantamento.
O Homem
Euclides da Cunha esteve em destaque , como já escrevi, pelo que representa a guerra de Canudos. A população pobre foi massacrada , fruto de uma campanha enganosa da parte do governo republicano que criou uma falsa ameaça de perigo que o grupo de revoltosos liderados por Antonio Conselheiro representava. O escritor, que no início de seu trabalho jornalístico acreditava nos valores do Exército, enxerga um pouco tarde a fraude, conclui que o povo a ser defendido eram os pobres e analfabetos de Canudos e acaba por acusar a expedição militar de criminosa. Esse conflito, nas mesas de Paraty, serviu de comparação com outros que aconteceram no Brasil, pelo autoritarismo, falsas campanhas , desastres ambientais recentes , morte de negros em periferias, entre outros mais.
A professora aposentada Walnice Nogueira Galvão, emérita da USP, estudiosa de Os Sertões, abriu a festa e já antecipou a analogia que viria a ser feita em outras mesas, do livro com o Brasil do nossos dias .Chegou a dizer que o Brasil é Canudos .Com coragem e sutileza, fez um paralelo às fraudes autoritárias da nossa história e disse que o livro deveria ser lido todos os dias para “ que se entenda o que acontece com os pobres do país”.
Nesta linha, destaco também a palestrante Aparecida Vilaça, doutora em antropologia social e professora do Museu Nacional recentemente destruído pelo incêndio. Fez um relato comovente das experiências vividas por mais de 20 anos numa comunidade indígena em Rondônia e seu laço afetivo com seu pai indígena Paletó, durante seu trabalho de pesquisa. Testemunhou o caráter e a sabedoria dos índios com quem conviveu , defendendo com doçura e veemência a preservação das terras e da cultura indígena , com a qual temos muito a aprender. Pedindo desculpas pelo pieguismo, ela pede amor à diversidade a quem está com seus direitos ameaçados.E conclui: “ Se não houver diversidade, morremos “
O músico e literato José Miguel Wisnik mostrou como o poeta Carlos Drummond de Andrade já previa, nos seus poemas e artigos, os desastres socioambientais em Minas , atacando a exploração feita pela Vale.
Wisnik também participou de uma homenagem ao jornalista falecido no ano passado, Otávio Frias Filho, na Casa Folha, ao lado do advogado da Folha Luis Francisco Carvalho Filho e a colunista Tati Bernardi. Eles apresentaram o escritor e artista Otávio Frias que por herança passou a dirigir um poderoso veículo de comunicação, o que , segundo Otávio, lhe roubava o tempo de criar. Entretanto criou como diretor o bem sucedido Projeto Folha.
Soube que Wisnik também fez uma homenagem a Chico Buarque de Holanda através de suas música na Casa Paratodos.
A escritora Marilene Felinto arrancou risos da plateia com sua impaciência bem-humorada. Criticou Euclides da Cunha, dizendo que os ancestrais dela provavelmente foram sobreviventes da degola em Canudos.Acusou o escritor de ter feito “ jornalismo comprometido com o Exército” vindo Euclides depois a se desculpar por isso. “A mim pouco importa a redenção de Euclides”.
O neurocientista Sidarta Ribeiro falou sobre sonho e lamentou que a sociedade não se preocupe em sonhar, em prever o futuro e assim se preparar para as tempestades que se avizinham.
Samuel Pessoa, doutor em Economia pela USP falou na Casa Folha sobre discriminação racial no mercado de trabalho. Defendeu a política de cotas que considera essencial por estimular mais esforço ,tanto dos membros da elite como dos mais pobres , mas alertou : o avanço só acontecerá quando for construído um setor público que consiga oferecer serviços básicos de qualidade a todos.
Muitas outras convidados apresentaram depoimentos interessantes e ausentes deste resumo.
A Luta
A Flip é um espaço público onde se expressam posições políticas exaltadas. O que aconteceu na noite da sexta-feira foi um retrato da lamentável polarização e intolerância vigentes no país.
No barco da Flipei, ancorado no Pontal da praia, esperava-se para a palestra o jornalista Glenn Greenwald, do site Intercept que divulgou as denúncias contra o Sérgio Moro. Junto com ele o humorista Gregório Duvivier. Juntou-se um número enorme de simpatizantes do PT neste lado do canal para ouvi-lo. Havia rumores de que os defensores do Moro e Bolsonaro preparavam um protesto no momento desta palestra, mas o que se viu foi surpreendente. Do lado direito do canal visto da ponte, um grupo de manifestantes empunhavam bandeiras amarelas, cantavam o Hino Nacional, com enormes caixas de som rebocadas por um carro e soltavam rojões com o intuito de abafar a fala do Greenwald. Era um grupo bem menor do que a concentração “Lula livre” do lado esquerdo do canal, mas muito bem equipado e barulhento. A margem esquerda revidava, cantando também o Hino Nacional e a versão de Bella Ciao. Glenn Greenwald chegou a Paraty num carro de vidro escuro e depois de lancha ao Pontal, escoltado por seguranças .Falou por alguns minutos .Defendeu o jornalismo investigativo e prenunciou novas publicações contra o juiz Moro.
Provocações dos dois lados , parecendo torcidas de futebol, só não viraram confronto violento pela intervenção militar na margem direita e pela água do canal iluminado pela lua separando os dois grupos .
No fim, a liberdade de expressão ganhou a luta , mas a cena escancarou bem o Brasil de hoje, dividido em posições políticas intransigentes e arrogantes. Até quando isso vai ?
Por que é impossível hoje alguém, com posição política definida, ouvir o que outra pessoa, com posição diferente, tem a dizer ou revelar ?
Que a paisagem de Paraty naquela noite de lua crescente, verdadeira bandeira branca de paz sem nenhuma nuvem negra no horizonte seja um sinal de um futuro sem extremismos e sem tensão social.
“ Viva Paraty” com seus fóruns de palavras sábias e sua natureza que traz paz de espírito. Vida longa à Flip !
Flip 2016 06/07/2016
Posted by Maria Elisa Porchat in Atualidades, Literatura.Tags: Ana Cristina Cesar, Fora Temer na Flip, individualismo atual, polarização política, tráfico de drogas
2 comments
- A Flip 2016 foi a mais politizada de todas. E se faltaram recursos para a sua organização , isso não empobreceu o conteúdo e a pauta dos debates refletiu os problemas que afligem a vida contemporânea, no Brasil e no mundo.
- A crise econômica ficou evidente na cidade , com menos filas na porta dos restaurantes badalados e com um número maior de pessoas fora da Tendas dos Autores, isto é, no telão e nos eventos gratuitos. As editoras de livros que fecharam as portas, entre elas a Cosac Naif, presente nas festas anteriores, foram homenageadas pelo curador Paulo Werneck já na abertura dos debates. E se, como dizem, o bom da crise, ( se é que tem um lado bom!) , é questionar, não faltou protesto e questionamento em Paraty nessa Flip.
- A polarização política foi marcante, como era de se esperar.Mais do que qualquer verso da poeta homenageada Ana Cristina César, a frase – “Fora, Temer !” era ouvida, ora de forma exaltada, ora cômica, dita por palestrantes e populares, escrita em cartazes e luzes no palco, dentro e fora das tendas, parecendo um slogan da Festa. Um poema do Temer chegou a ser lido e ridicularizado por uma poeta convidada e o uso que ele faz de mesóclises foi motivo de chacota . Nada a ver. A verdade é que também não se viu nem ouviu um – “Volta, Dilma!” – nem a defesa de uma figura política que viesse substituir o presidente interino. Tinha a impressão de que o repetido “Fora Temer” significava mais um “Fora, classe política” ou um grito de socorro.
- Protestou-se contra a ausência de negros nas mesas debatedoras e na platéia da tenda , contra a educação atual, o machismo,o progresso que depreda, a especulação imobiliária que levou à morte um caiçara em Trindade, perto de Paraty e também contra a homofobia. Duas mulheres caminharam pela Tenda, erguendo uma faixa em protesto contra as informações sobre a poeta homenageada onde se lia : “Ana C. era gay. Por que omitir ?”
- Na Casa Folha houve um debate quente sobre direita e esquerda no Brasil,com o doutor em Economia Samuel Pessôa e o deputado carioca do Psol Marcelo Freixo, ambos colunistas da Folha. Sob os gritos de “Vem pra rua! ” da calçada, Samuel acusou a esquerda brasileira de não entender nada de economia, de pobreza intelectual e de não olhar para a história recente da América Latina antes de definir seus pontos de vista. Já o deputado do Psol atacou representantes da direita no Brasil nas questões de racismo e homofobia .Para ele, limitar o debate à economia enfraquece a democracia porque as pessoas não vão ficar mais ou menos felizes por causa da taxa Selic. Do lado de fora uma pessoa gritou que o discurso de Freixo era vazio.Recebeu vaia.
- Dentro da Tenda dos Autores, no cenário do palco havia uma aquarela bonita e sobre ela lia-se a frase da poeta Ana C.( era como a homenageada gostava de ser chamada ) : “As construções humanas desafiam os seus criadores e emitem ondas.”
- Por falar em construção, dois arquitetos e urbanistas , o italiano Francesco Careri e a pernambucana Lúcia Leitão criticaram as cidades sem calçadas e sem espaços de convívio, o que expressa uma sociedade individualista que prefere se isolar em condomínios fechados . Lembraram que na Europa o espaço da rua é ato de cultura e de democracia e recomendaram que as pessoas baixem o nível do medo e caminhem pelas ruas , encontrem e enxerguem outras pessoas e se aproximem da humanidade. E que vão além na caminhada, explorando zonas inesperadas, com intenção estética. Espero que meus netos um dia possam caminhar sem medo por onde quiserem ir. A mesa também abordou o número crescente de refugiados no mundo, o que vai exigir da ONU e dos governos , cidades mais acolhedoras.
- O individualismo extremo e a angústia da nossa sociedade foram abordados de uma forma interessante na mesa “ Show do Eu” que reuniu o psicanalista paulista Christian Dunker e a argentina Paula Sibilia. Individualismo que se mostra na mania das selfies e nas redes sociais, no marketing pessoal, que se manifesta no culto do corpo,no narcisismo e no consumismo. A pessoa busca o olhar do outro apenas para se definir, mesmo porque o outro tornou-se perigoso , o que a leva a construir muros. Sair de dentro de si para ser visto pelo outro traz um vazio, um sofrimento e o mercado se aproveita disso para vender soluções milagrosas e remédios.
- A educação de hoje é responsável por esse individualismo exagerado. Nasce Sua Majestade o Bebê, que durante toda a sua formação tem seus conflitos negados até crescer e se deparar com uma realidade adversa. E aí o que fazer ? Muda-se para um lugar bem distante, como Austrália.
- Para os palestrantes, mudar esse culto ao individualismo cabe não só aos pais mas também à escola, que hoje precisa ser reinventada, com professores que desejem estar mais próximos de seus alunos em termos de conhecimento e dos seus conflitos.
- A mesa que reuniu os escritores J.P.Cuenca e a mexicana Valéria Luiselli sobre seus livros que apresentam os limites da ficção e da realidade, mencionou a falta de educação literária.A criança está entre o que a escola manda ler e o que o mercado manda comprar , como por exemplo, o livro sobre vampiros.E no meio disso está a literatura. Para Cuenca, a Flip faz do escritor uma espécie de caixeiro viajante, um ator a fazer performance para vender seu livro.
- Dois repórteres investigativos , o inglês Misha Glenny e o Caco Barcellos puseram o dedo na ferida social do tráfico , ao mostrarem que vivemos no Brasil uma guerra não declarada, que não choca a classe média porque envolve os mais pobres e desassistidos. A taxa de mortes no Rio de Janeiro é três vezes maior do quem em Nova Iorque e a causa é o tráfico da cocaína, fora do controle das autoridades. As drogas nunca deixaram de existir na Rocinha mesmo com a presença da polícia. Juiz e promotor não sobem o morro. Caco Barcellos provocou a platéia ao dizer que nos achamos muito sabidos, mas o trabalhador de baixa renda é muito mais bem informado . A empregada doméstica conhece a realidade dela e a da patroa ,mas o inverso não acontece. Hoje o tráfico compete com o trabalho formal e é difícil para uma mãe que trabalha como doméstica convencer o filho que sustenta a casa com o dinheiro do tráfico a seguir seu exemplo de trabalho honesto.A política de combate às drogas para ele passa pela descriminalização.Para o repórter, quem proíbe drogas é a favor do tráfico.
- O momento de descontração aconteceu com os humoristas – o português Ricardo Araújo Pereira e Tati Bernardi, mediados por Gregório Duvivier . O humor também politizou. Começou com o cumprimento dito bem rápido pelo Gregório : “Boa tarde foraTemer”.E terminou com um desabafo de Tati Bernardi sobre a tristeza que sente em relação ao Lula, uma vez que desde criança aprendeu com a mãe a amá-lo. Foi dito que o momento em que os políticos nos fazem rir é quando os humoristas devem nos fazer pensar.
- Para a neurocientista Suzana Herculano-Houzel, o Brasil está fadado a copiar tecnologias de fora. Hoje ela trabalha numa universidade dos Estados Unidos e foi criticada por ser mais uma cientista a fugir do Brasil. Lamenta a condição de trabalho dos cientistas por aqui, condição piorada com a decisão do Temer de não ter mais um ministério dedicado à ciência. Disse que as pessoas não têm idéia de como a ciência é importante para suas vidas. E aos que dizem que os cientistas tiram a poesia das coisas por dizerem que somos apenas o produto da matéria, ela diz que é muito bonito ver a forma como as moléculas se organizam e chegam a formar pessoas capazes de transmitir e provocar emoções. Também participou da mesa o cirurgião de cérebros Henry Marsh que comoveu a platéia ao falar das cirurgias complicadas e mal sucedidas que fez. Ambos foram questionados sobre a utilidade imediata da neurociência, principalmente no que se refere ao prolongamento da vida, mas responderam que não se pesquisa com esse propósito. O escritor Saramago nessa hora foi mencionado por escrever que precisamos fazer as pazes com o fato de a vida ter prazo de validade.
- Santos Dumont foi homenageado numa mesa que juntou o romancista holandês Arthur Japin e o artista plástico Guto Lacaz. Tímido, trágico, solitário, Dumont parecia não se encaixar na sociedade.Primeiro homem a voar , foi apresentado como um designer genial, de grande sensibilidade, que deve ser fonte de inspiração para todos os designers, na arte de construir coisas para um mundo melhor.
- O jornalista e poeta premiado Leonardo Fróes há muitos anos abandonou a turbulência da cidade e foi com a mulher morar num sítio .Falou de um modo maravilhado do amor que tem pela natureza, muito maior do que o prazer que sentia com a vida social. Criou o hábito de subir montanhas, recomenda o hábito pelo aprendizado com as descidas , ouve as vozes das espécies e encontra entre as árvores a inspiração para suas poesias. Interrogado sobre o desastre de Mariana, Fróes respondeu que o Brasil todo corre o mesmo risco por causa da indústria de mineração e porque os morros hoje são fatiados e deformados.A única solução para evitar catástrofes como a de Mariana é evitar o consumismo. Um carro, por exemplo, para Fróes, tem de ser usado até acabar.
- A mesa mais procurada da Flip, a dos ingressos que logo se esgotaram, foi a da bielorrussa Svetlana Aleksiévitch, prêmio Nobel de Literatura 2015. Auditório lotado, passeata fora da Tenda, Svetlana cativou logo ao entrar no palco .Falou das pessoas que sofreram em guerras e de Chernobil , acidente nuclear que mudou radicalmente a vida de muitas pessoas. Vendo a figura humana e o jeito amigo de Svetlana deu para entender como ela consegue tirar dos seus entrevistados a confissão de seus sentimentos mais escondidos. Agora escreve um livro sobre o amor, e rindo, disse que está sendo mais difícil do que escrever sobre a guerra. De qualquer forma hoje não tem mais capacidade de ir a um campo de batalha e de ver cadáveres. Quer escrever em casa e curtir sua neta. Svetlana foi aplaudida de pé .
- Por sua vez, outro representante da literatura de fora , em vez de aplauso recebeu vaia.O poeta sírio Abud Said, convidado para falar sobre a guerra no seu país, recebeu vaias e desapareceu logo que a apresentação terminou. Ele obteve sucesso escrevendo no Facebook, sobre sua rotina, seus parentes e sobre a vida. Seu irmão foi morto pelo Estado Islâmico e sua mãe vive como refugiada na Turquia. Disse que virou escritor sem querer e que estava adorando o serviço cinco estrelas que a Flip estava lhe oferecendo. Abud Said se recusou a falar da Guerra na Síria, sobre o Estado Islâmico e sobre os refugiados, apesar das perguntas insistentes. Até aí a platéia aceitou diante do seu jeito modesto. A vaia veio quando ele se pôs a criticar os jornalistas , os intelectuais e os defensores dos direitos humanos, que segundo ele, fazem um jogo sujo e interesseiro do qual ele não quer participar.
- Bem, da poeta Ana Cristina César muito se falou , de sua figura , da sua vida curta e intensa, mas sua poesia é difícil de ser lida. Representante da poesia que fica à margem das editoras, aquela nem que o autor produz e distribui seus textos, Ana C. misturava gêneros, não separou poesia de prosa, inseriu diários , cartas e foi avessa à poesia confessional. Na Flip foi comparada a Clarice Lispector pela aposta que fizeram no poder da linguagem. Feminista, embora recusando rótulos, achava que a mulher tinha de lutar contra estereótipos .Suicidou-se ainda jovem , teve em vida apenas um livro publicado mas até hoje exerce influência nos poetas contemporâneos. Foi uma voz bem diferente na literatura, o que é bem do agrado da curadoria da Flip. Na última mesa, dois críticos literários, Sérgio Alcides e Vilma Arêas fizeram um balanço da obra de Ana Cristina. Vilma, que foi professora da poeta , leu um poema, bem emocionada, escrito por um outro representante da literatura marginal para a Ana C. depois que ela morreu. O poema terminava assim :
- “ Ana Cristina, cadê você ?
- Estou aqui, você não vê ?”
- No encerramento, o curador Paulo Werneck convidou o público a recitar o verso, e todos, dentro e fora no telão responderam : “ Estou aqui, você não vê ?”
Flipei de novo em 2015 07/07/2015
Posted by Maria Elisa Porchat in Atualidades, Diversos, Literatura.Tags: Flip da crise, literatura, Mario de Andrade, Matilde Campilho, modernista, O Turista Aprendiz, violência em Paraty
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Flipei de novo.Pela sétima ou oitava vez, já perdi a conta. E a aqui vai minha costumeira peneirada, não se trata de um resumo, mas de algumas anotações sobre a Festa Literária de Paraty.
Mário de Andrade tem um livro sobre uma expedição que fez e que foi tema de mesa – O Turista Aprendiz. Daí eu pergunto: não é também um turista aprendiz aquele que frequenta a festa de literatura ? Porque tem interesse no que os autores convidados têm a dizer, mas também busca entretenimento, indo de um lado pra outro, da tenda pra Casa Folha, de lá pra Casa da Cultura, em seguida aos musicais da Praça Matriz , não querendo perder nenhuma mesa, nem as delícias da rua e da praia.
E o turista aprendiz sempre aprende. Fica sabendo que um recepcionista de hotel em Paraty estranha quando um hóspede declara como profissão a de poeta, que no entanto é um ofício que não dá descanso nem quando se dorme. Um trabalho que exige rotina e disciplina.
Aprende que a literatura erótica mostra a precariedade humana e que aqui no Brasil ela geralmente é de deboche, enquanto em outros países chega a ser trágica.
Que em relação ao luto, o esforço intelectual pode ajudar o sofredor e que o ato de escrever sobre a dor pode ser um dos caminhos para superar a perda da pessoa amada.
Fica sabendo a dimensão da força política de uma charge e que um desenho engraçado serve de arma poderosa contra os opressores.
Que a alta matemática, não aquela que se aprende na escola, mas a dos sistemas complexos, tem beleza e dá prazer. Pode ser feita em qualquer lugar e em qualquer hora. Existem estereótipos e muita resistência do público com respeito a essa área do conhecimento, conforme o depoimento dos premiados matemáticos que participaram da Flip.
Assustado, o turista de Paraty toma conhecimento da situação complexa do narcotráfico no México, onde todas as áreas da sociedades estão corrompidas pelos cartéis de crime organizado numa rede complexa que une Europa, Estados Unidos e América Latina.
Aprende ouvindo a palestra do economista Eduardo Giannetti e do neurocientista Sidarta Ribeiro que estamos a caminho de entender a consciência, que existe sempre uma máquina biológica atrás da consciência e que somos sempre regidos por um mecanismo físico. Em certo momento Giannetti, que pesquisa as consequências éticas de nossas decisões e a origem da nossa consciência lança uma pergunta que fica sem resposta : o que fazer contra a crise civilizatória? Sobre a arte, Giannetti observa que ela tem que ser valorizada não do ponto de vista estético ou do entretenimento, mas do conhecimento humano e do reconhecimento de valores.
As historiadoras Lilia Schwarcz e Heloisa Starling que lançam Brasil : uma biografia ensinam os curiosos da Flip que os sermões do Padre Vieira já falavam de corrupção e que a escravidão sempre foi o sistema estruturante na nossa história do Brasil, onde o racismo é dissimulado.
Foi oportuna a escolha do Mário de Andrade como homenageado, não só pelos 70 anos de sua morte, pela sua genialidade e por ser o mais atuante modernista , mas também por ter valorizado as artes populares e ter trabalhado na preservação do patrimônio cultural do território brasileiro.Dizia que o dia em que o Brasil olhasse para a arte popular seria um país melhor.Musicólogo, além de muito mais, ( ele mesmo escreveu Eu sou Trezentos, eu sou Trezentos e Cincoenta ) desbravou a música popular de raiz, os ritmos indígenas, as músicas africanas, os ranchos, as modinhas, as cirandas…. : a cara de Paraty.
A cidade de São Paulo esteve na berlinda nessa Flip numa pauta inspirada pelo livro Paulicéia Desvairada de Mário de Andrade. O historiador Bóris Fausto lembrou, saudosista e fazendo a plateia rir, da São Paulo de antigamente, que em nada lembra a São Paulo de hoje, só melhorando no quesito – hospitais.
Uma mesa reuniu o jornalista Roberto Pompeu de Toledo que acaba de lançar mais um livro sobre São Paulo e Carlos Augusto Calil , autor de um livro a respeito do trabalho de Mário de Andrade no Departamento de Cultura da cidade. Falaram da época em que São Paulo era a capital da vertigem, do contexto da Semana da Arte Moderna de 22, dos salões literários e sobre a elite que se propunha a investir nas necessidades de São Paulo, como na USP, no MASP, no MAM, na Bienal e até nos estúdios da Vera Cruz.
Na linha do pensamento de Mário de Andrade da cidade como território, o antropólogo Antonio Risério e o poeta Eucanaã Ferraz debateram arquitetura e lamentaram que as grandes cidades hoje carecem de espaços de convívio e se caracterizam pela expansão, segregação e a exclusão. O chão precisa ser compartilhável. ”Não existe tragédia a caminho. A merda já aconteceu. Agora é remediar”.Para surpresa da plateia e de quem critica o Haddad na questão da ciclovia, o prefeito foi elogiado por ser o primeiro a encarar o automóvel e a pensar na cidade do ponto de vista urbanístico.
Desvairada também começa a ficar Paraty que, fora das festas,sempre foi pacata. Hoje sofre com registros de violência,falta de infraestrutura e vê seu patrimônio cultural e ambiental ameaçado.Uma passeata de moradores tomou conta da ponte no sábado, na frente da tenda, pedindo paz e segurança.
A crise política , como não poderia deixar de ser, surgiu em quase todas as conversas da Flip. Com muito mais perguntas do que respostas, mediadores e plateia indagaram convidados sobre o que vai acontecer daqui pra frente e ninguém se atreveu a dar uma previsão. Houve encontros sobre política na Casa Folha .No primeiro, foram discutidas as razões da crise no governo Dilma. Por que degringolou ? O colunista Bernardo Mello Franco frisou as pedaladas nas contas públicas para disfarçar o desarranjo econômico e se reeleger. O coordenador nacional do MST ( Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto) Guilherme Boulos, depois de atacar duramente o presidente da Câmara Eduardo Cunha por suas manobras políticas para aprovar projetos de seu interesse, criticou as estratégias do PT no governo e o ajuste fiscal proposto agora , penalizando o lombo dos mais pobres.
A Casa Folha também ouviu o cientista político Demétrio Magnoli sobre a situação do Brasil no cenário mundial. Ele criticou o PT, Dilma e Lula por terem prometido um governo de ruptura com um regime social injusto e ofereceu um governo de restauração de uma política antiga, da era Vargas – patrimonialista , com um estado centralizador, apoiado por um grupo de empresários.Para ele, a ruptura se deu com FHC. E agora, Magnolli, o que vai acontecer? Resposta : Não dá para saber.Ainda não apareceu nenhuma força política interessada em dialogar com a indignação popular.
Mas por que tanta política numa festa de literatura ? A Flip sempre saiu do território literário para discutir assuntos diversos do interesse público , tendo como critério a seleção de autores de bons livros. Mas neste ano viajou mais longe : falou de matemática, de neurociência, de narcotráfico e repito, muito de política.
Essa foi a Flip da crise – a mundial com seus conflitos, a brasileira que está num impasse , a de São Paulo desvairada e a de Paraty insegura. Como afago, a poeta lisboeta Matilde Campilho que mora no Rio falou de poesia de um jeito que conquistou toda a Flip. Disse que a crise vai passar mas até lá o caminho é de pedra. Mas se o mundo está arrebentado e o Brasil está arrebentado, na impossibilidade de salvá-los sozinho, a poeta aconselha a salvar cada momento, um minuto ou segundo, nos salvar e salvar quem está do nosso lado.
Depois de ouvir a Matilde, ao turista aprendiz só restou ir à livraria e comprar um livro de poesia. Que todos se salvem.
Peneirada da Flip 2014 06/08/2014
Posted by Maria Elisa Porchat in Atualidades, Diversos, Literatura.Tags: comida saudável, golpe militar, humor, Millor Fernandes, Paraty, Pasquim
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A Flip deste ano foi a cara do homenageado: cheia de humor, irônica e contestadora. Por ser Millor Fernandes cheio de facetas e extraordinário em todas elas, ele estava presente em quase todas as mesas literárias – no cenário das tendas, nas ilustrações, nas frases lapidares que introduziam os debates e nos temas da programação.
Duas mesas foram exclusivas para ele. A de abertura começou com o crítico Agnaldo Farias destacando o valor de Millor como artista plástico, pensador e artista da palavra. Em seguida, os humoristas Reinaldo, Hubert e o Jaguar contaram sobre o convívio divertido com Millor na época das revistas Pifpaf e Pasquim. Ele fazia tudo em casa e só chegava na redação para conversar e atrapalhar o fechamento.
A segunda mesa, com o jornalista Sérgio Augusto e os caricaturistas Claudius e Cássio Loredano, destacou a integridade, a independência e a coragem do guru do Méier diante dos os militares. Millor abordava qualquer tema através de paradoxos, pelo avesso, com liberdade, – “ o livre pensar é só pensar”.Vigiava a coisa pública e denunciava maracutaias. O Pasquim fazia resistência à ditadura e Millor só não foi preso porque era tão genial que desconcertava até os censores. ”A Justiça farda mas não talha.” Brincava com a língua como ninguém e mesmo ao desenhar, sempre começava com uma ideia verbal, numa combinação perfeita de desenho e palavra escrita.
Riu-se muito com o humor inteligente de Antonio Prata e do paquistanês Mohsin Hamid.Falam com muita ironia de si mesmos e do mundo.Para Prata, a literatura mostra a vida como ela é; já a realidade é “fotoshopada” com as celulites que a vida tem. O Brasil tem mais a ver com o Paquistão do que com os Estados Unidos, pelo desconforto com a desigualdade social. Mohsin Hamid no seus livros não quer “exotizar”, ser um paquistanês, mas escrever para algum leitor que com ele se identifique.Lançou na Flip – Como ficar podre de rico na Ásia emergente.
Uma mesa sobre poesia e prosa com Gregório Duvivier, Eliane Brum e Charles Peixoto também lembrou Millor, um poeta do humano.Para o humorista Duvivier, humor e poesia são similares porque têm um olhar diferente sobre as coisas, subvertem as verdades estabelecidas e lembram que nada deve parecer natural.São formas de resistência.Duvivier tem duas coletâneas de poemas.
Segundo Charles Peixoto, sua poesia marginal carioca, de inspiração hippie sempre foi esculhambada pela crítica.Lançou na Flip o volume de obre reunida Supertrampo.
Sucesso na mesa fez a repórter e poeta Eliane Brum. A leitura e a escrita a salvaram de uma infância árida e triste. “ No processo de escrita fui possuída por mim mesma”.Deixando a plateia com a respiração suspensa, Eliane contou que nas reportagens da série A Vida que Ninguém Vê descobriu poesia na fala dos entrevistados, linguagens que tinham que ser entendidas. “Uma parteira é chamada para povoar o mundo, nas horas mortas da noite”, ouviu de uma entrevistada. Pura poesia pela boca . Eliane Brum lançou Meus desacontecimentos , na Flip.
Cacá Diegues num bate-papo com Edu Lobo tocou no patrulhamento ideológico que sofreu para filmar Xica da Silva. Não se pode brincar com a escravidão. Quem disse? Pode-se brincar com tudo. Taí o Millor. Cacá contou que conseguiu um papel para Cartola num filme seu para ajudá-lo financeiramente. Na Flip lançou a autobiografia Vida de Cinema – antes, durante e depois do Cinema Novo.Edu Lobo lançou São bonitas as canções, uma retrospectiva de sua carreira.
Vladimir Sorókin foi o primeiro escritor russo a vir para Paraty. É representante da literatura underground, aquela que foge dos padrões comerciais, fora da mídia. Para ele, a literatura é como um tiro silencioso.Você não escuta, não sente, mas é atingido.O humor, assim como a vodka é necessário para enfrentar a severidade da Rússia, país que está sendo tomado pelo autoritarismo.
A arquitetura mais uma vez foi tema da Flip.O arquiteto Paulo Mendes da Rocha , que preconiza uma arquitetura socialmente responsável, e o critico italiano Francesco Dal Co conversaram sobre as afinidades entre Veneza e Paraty. As duas cidades foram invadidas pela água, foram de difícil construção mas venceram os desafios . A arquitetura transforma a natureza para ser habitada. É a porta de entrada para uma reflexão sobre a cidade. Toda cidade é feita de conflitos – comerciais, politicos, ambientais, mas são eles que produzem melhorias. Apenas os conflitos mortais destroem cidades, como acontece na Faixa de Gaza.
Gaza, claro, foi abordada pelo escritor israelense Etgar Keret, hoje o principal nome da literatura de Israel,apresentado como aquele que tem os livros mais roubados nas bibliotecas. Viver numa região permanentemente em conflito o levou a fazer humor na catástrofe, uma forma de protesto contra a realidade. Nos conflitos, a ficção é uma zona segura .Para ele, é possível sim dividir por dois um pedaço de terra, de modo vivível. Marcante também na vida de Keret o drama de seus pais que viveram o holocausto, fazendo com que ele evitasse desde pequeno causar qualquer tipo de sofrimento à mãe. Lançou na Flip – De repente, uma batida na porta.
Dor familiar comoveu a plateia no depoimento emocionado de Marcelo Rubens Paiva durante a mesa de lembrou os cinquenta anos do golpe militar. O escritor estava sob o impacto da voz do pai transmitida num pronunciamento do deputado, feito no dia primeiro de abril de 64.Chorou ao lembrar o drama que a família viveu com o seu desaparecimento, após tortura e morte nos porões da ditadura .Falou da luta e transformação de sua mãe, hoje com Mal de Alzheimer.” Quem realmente combateu a ditadura, foram mulheres como minha mãe a a estilista Zuzu Angel “ -disse.
Marcelo Rubens Paiva é cético quanto ao trabalho da Comissão da Verdade no esclarecimento dos casos de pessoa desaparecidas, mas acredita no do Ministério Público. Para ele, as Forças Armadas não se reciclaram, não repudiaram o que aconteceu e existe grupo de tortura ainda articulado no Brasil.
A discussão política esteve presente até quando se falou de comida, com Michael Pollan, para quem na mesa de almoço temos as primeiras lições de democracia e sociabilidade. O autor de Em Defesa da Comida – um manifesto – criticou a política de alimentação nos Estados Unidos, que deveria parar de dar apoio à indústria alimentícia e dar mais atenção à prevenção da saúde. Criticou a indústria de combustível que usa cana- de- açúcar e milho, e em vez de alimentar crianças, alimenta caminhões. Acrescentou que fast-food está para a comida assim como a pornografia está para o sexo. Deu 4 dicas de alimentação para crianças que só comem besteira : que os pais comam alimentos saudáveis diante delas, que as crianças também cozinhem, que plantem hortaliças e que só haja comida saudável nos armários da cozinha.
A política americana em suas entranhas de corrupção e serviços de espionagem foi atacada no encontro de Glenn Greenwald, advogado e jornalista, com o documentarista Charles Ferguson que denunciou os interesses por trás da crise financeira de 2008. Após as denúncias, Snowden está asilado na Rússia, mas Greenwald acha que todos os países que se beneficiaram das denúncias de Snowden, como Brasil e Alemanha deveriam recebê-lo. Snowden denunciou o esquema de espionagem por achar que a grande mídia apoia o sistema corrupto e falho das instituições americanas.
Para Andrew Solomon, autor de livros sobre depressão, o oposto da depressão é a vitalidade. A depressão é cíclica e ensina a entender as pessoa e a tolerar o que há de ruim no mundo. Solomon pesquisou identidades que não correspondem aos padrões sociais mais básicos como autismo, surdez, transexualismo e outros.Defende uma criação e educação que reconheça essas identidades pelo que são e as ajude a encontrar a autoestima.
Outra frase do Millor – “A Astronomia é o Ph.D. da Astrologia”. O físico e articulista Marcelo Geiser e o professor Paulo Varella falaram de Ciência e Astronomia de forma clara e até poética sobre os limites do conhecimento científico, sobre a visão do universo e do céu sobre a nossa cabeça. É preciso olhar para cima, para os astros, ( a iluminação da rua não pode ser voltada para cima, mas para baixo ) mesmo que se trate de um céu do passado, porque com a velocidade da luz, o que vemos já passou. As distâncias são tão incríveis que uma viagem interestelar é impossível. O avanço da tecnologia leva ao conhecimento, mas sempre de modo incompleto e limitado. Indagado sobre a influência dos astros na vida dos homens, a Astrologia, Paulo Varella respondeu ao estilo do Millor : “Nós , de Leão, somos céticos em relação a isso”.
Se em quase todas as discussões, podia-se fazer um gancho com a vida e a arte de Millor Fernandes, na última a que assisti, parecia que Millor estava encarnado na Fernanda Torres. – engraçada, irreverente e provocativa . Fernanda ironizou o fato de seu colega de mesa , o peruano Daniel Alarcon estar lançando um livro cujo enredo fala de teatro, algo fora de moda.”Sou mais valorizada aqui na Flip como escritora – ator parece não valer nada, mas um autor vale muito”. Romance de Fernanda – Fim e o de Daniel Alarcon – À Noite Andamos em Círculos. Mesmo sob risos, Fernanda fez uma crítica séria à crise do teatro e do cinema, hoje presos ao entretenimento para sobreviver.
A Flip de 2014 teve uma estrutura diferente, mais simples e barata, sem a grande tenda do Telão, que foi substituída por dois telões ao ar livre, de acesso gratuito e que funcionaram a contento. O tempo ajudou, sol de inverno gostoso e à noite, um céu lindão com lua crescente.
Ruas lotadas, as artes mais variadas nas calçadas,teatrinho de sombras, ambulantes de livros, cordel, (poesia cósmica !) artesanato , muita música, carrinhos de cocada e bolo de mandioca.
Termino com uma última frase do Millor que eu li na exposição da Casa da Cultura e adorei : “O bicheiro morreu de repente deixando mulher, três filhos e o delegado de Polícia totalmente desamparados.”
Carona num táxi 10/12/2013
Posted by Maria Elisa Porchat in Atualidades.Tags: altruísmo num táxi, aplicativos de táxi no celular, Black Friday, dificuldade de táxi, medo de assalto
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Era apresentação de minha neta no teatro. Para não chegar atrasada, só me restou pedir a um rapaz desconhecido que me deixasse ir com ele no táxi .
Estava sem carro no final de tarde chuvoso, da sexta-feira Black Friday. Minha netinha havia pedido para eu não me atrasar para vê-la no Hamlet infantil. Chamei um táxi nos vários pontos que há por perto de casa e nada. Tentei nos aplicativos que tenho no celular e que nunca me deixam na mão e nem assim fui atendida. O tempo passava e eu aflita, procurei táxi nas ruas, com garoa na cabeça e um buquê de flores na mão e só passava carro com gente. Rezei pro meu santo. Imediatamente parou no sinal um táxi ocupado por um rapaz. Não titubeei:
– Você está perto do seu destino?
– Um pouco.
-Posso ir com você na sua corrida?
– Ss… Já fui sentando no banco da frente. Foram somente uns 3 quarteirões e daí o compreensivo rapaz desceu, não antes de ouvir minha história e meus fervorosos agradecimentos.
O motorista comentou que estava na praça há quinze anos e nunca tinha presenciado uma cena como aquela. Nem eu pensei que um dia fosse parar um táxi ocupado na rua, o que vim a saber depois, é um expediente comum em outros países.
Aqui no Brasil o medo de assalto dificulta ações de despreendimento, como essa de dividir táxi com desconhecido. Pena. Felizmente tive sorte e um santo forte que me ajudaram a chegar ao meu destino no tempo certo.
Passeata no 7 de Setembro 10/09/2013
Posted by Maria Elisa Porchat in Atualidades, Diversos.Tags: Congresso decente, Diversidade de reivindicações, Ficha limpa, Liberdade de expressão, Vandalismo na passeata
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Fui à passeata na Paulista sábado, 7 de setembro. Aquela que, segundo as redes sociais seria “a maior manifestação de protesto da História do Brasil”. Eu não poderia ficar fora.
Minha posição: não concordo com os que dizem que a situação nunca esteve tão ruim.Vivi tempos piores.Acho o pessimismo atual maior do que o justificado pela realidade.Mas até porque hoje somos mais livres para reclamar, também quero pôr pra fora minha revolta contra o que eu considero nosso maior “osso”: a sujeira no Congresso.
E lá fui eu para a Paulista no Dia da Pátria, com um lencinho patriótico no pescoço e de branco porque sou da paz. Comodista, não levei cartaz nem faixa, pensando em me integrar num grupo que também estivesse clamando por um país mais ficha limpa.
De imediato, saltou aos olhos a liderança dos mascarados de preto. Eram muitos, tomaram a dianteira da passeata e provocavam os policiais que estavam de prontidão. Num carro de som, um alto-falante ameaçava um confronto com a Polícia caso um deles fosse detido. Depois soube que o confronto aconteceu na região do Centro, com vandalismo na Câmara Municipal.
A presença dos mascarados foi um dos motivos do malogro da passeata no sábado. O outro foi a pluralidade de reivindicações, algumas até contraditórias e divergentes. Onde está nessa avenida a faixa para chamar de minha? Tinha de tudo: mudanças na maioridade penal, pela redução nos impostos, mais saúde, mais hospitais, pela educação, pela reforma política, mais democracia,fim do cabine de empregos, fim do voto secreto,revisão de aposentadorias e mais isso e fim daquilo…anseios justos, mas tão diversificados que perdiam força na aglomeração.
Continuei na busca. Queremos a volta do Bingo ( af! ) E a pior : Intervenção militar – contra a ditadura comunista ( será que é no Brasil ? )
Finalmente encontrei meu lugar na avenida. Ao lado de um casal que carregava todo pimpão uma faixa enorme : Alagoanos,vomitem o Renan.O Brasil agradece. Pronto. É aqui que eu vou caminhar.
Para mim, os protestos de hoje deveriam ter como ponto de convergência a moralização da classe política. E um bom começo é pôr para fora todo deputado e senador corrupto. Cada um de uma vez, com muito panelaço, apito e gritaria. Com um Congresso decente, tudo vem em consequência: a aprovação da reforma tributária, da política, da fiscal, mais dinheiro para a saúde, para a educação, para a previdência…
Com liberdade para se manifestar, sem violência nem vandalismo, com esforço concentrado numa reivindicação de cada vez, o povo brasileiro terá muito mais chance de ser ouvido nos seus protestos. Chance de ter um Congresso ficha limpa. Um futuro ficha limpa. Onde vai ser a próxima passeata?
Flip 2013 08/07/2013
Posted by Maria Elisa Porchat in A Língua Portuguesa Adequada, Atualidades, Literatura.Tags: Graciliano Ramos, literatura, poesia, política, prosa, protesto
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Tento resumir o que ouvi e vi ao chegar da Flip de Paraty. A cabeça volta um liquidificador ligado, depois de tanta informação e reflexão dos palestrantes. Procuro pôr no papel o que me marcou, o nome dos convidados interessantes, suas boas tiradas, para impedir que fujam imediatamente da minha memória.
Paraty esteve mais efervescente este ano com os protestos e passeatas que acontecem já há um mês. A organização do evento houve por bem acrescentar ao conjunto de mesas sobre poesia, romance e tudo o que se relaciona com literatura, alguns debates políticos, o que tornou a festa ainda mais pulsante. A escolha do homenageado, Graciliano Ramos, apesar de ter sido feita meses atrás, não poderia vir mais a calhar no contexto deste julho de 2013. Graciliano renovou a linguagem, foi altamente engajado na política brasileira da época, era um idealista e extremamente ético.
Começo pela poesia. Conheci a nova poesia, através de três jovens garotas poetas lindas tanto no aspecto como nos versos cheios de profundidade : Alice Sant’Anna, Ana Martins Marques e Bruna Beber. Falaram dos seus encantos e desencantos com as palavras no momento da escrita. A utilidade da poesia ? É como uma varanda, onde se descansa e respira. Na poesia, um objeto sem graça como uma maçaneta ganha interesse e nos faz sonhar.
A poesia de rebeldia dos poetas Nicolas Behr e Zuca Sardan fez a plateia gargalhar com a irreverência e verve crítica . Defenderam os versos que vão contra as velhas ideologias e as regras rígidas. Nicolas, que mora em Brasília também quis protestar e tirou da mochila cartazes assim :
“A poesia pede passagem grátis”,“O Brasil acordou e a poesia concordou”, “ O poema lido jamais será vencido.
Para eles, o bom poema é aquele que machuca , que incomoda como as pedras do chão de Paraty.
O ponto alto da poesia declamada em Paraty saiu de uma dupla maravilhosa : Cleonice Berardinelli, membro da Academia Brasileira de Letras tida como a maior conhecedora brasileira da obra de Pessoa e Maria Bethânia.Pelos microfones, a cidade toda pôde se emocionar com os versos de Pessoa, com o entusiasmo e atuação da professora Cleo e com a atitude generosa, de respeito e admiração de Bethânia para com sua parceira de 97 anos.
Passando para a prosa, quais os limites dela? Segundo a escritora americana Lydia Davis e para o premiado irlandês John Banville não há. Cada um à sua maneira se distancia do realismo psicológico e fala sobre suas invenções, como a de habitar a mente de uma mosca.
Um novo modelo de romance histórico foi defendido pelo bósnio Aleksabder Hemon e pelo francês Laurent Binet.Como fazer para que milhões de judeus ou de soldados mortos não sejam esquecidos ? Só através da imaginação oferecida pela literatura. É preciso a acrescentar algo à realidade e a chave do sucesso de um romance é a imaginação associada à investigação histórica.
A iraniana Lila Azam Zanganeh foi eleita nas conversas a musa da Flip 2013. Poliglota, conversou num português cheio de sotaque e charme com o poeta carioca Francisco Bosco sobre textos de prazer e de gozo. Os de gozo somam ao prazer, a dor e a destruição da linguagem. São romances de transgressão, como Lolita de Nabokov, que representa o êxtase, a felicidade e o encantamento, principal objeto de estudo da iraniana que aos 26 anos começou a dar aula de literatura em Harvard.
Saindo da ficção, tive orgulho de ver na Casa Folha minha sobrinha Silvia Bittencourt, jornalista radicada na Alemanha, apresentar e autografar seu livro A Cozinha Venenosa – um jornal contra Hitler. Durante três anos, Silvia superou desafios na pesquisa da história do Munchener Post, jornal que mesmo antes de Hitler tomar o poder já lhe fazia oposição vigorosa, tornando-se o maior inimigo nazista na imprensa, até ser fechado.
O escritor Rui Castro falou da sua experiência como biógrafo na Casa da Cultura. São 24 horas diárias de envolvimento com dos detalhes da vida do biografado. Ele chegou a procurar até a exaustão a marca da escarradeira que ficava na redação onde trabalhou Nelson Rodrigues.Para Rui Castro, o bom biógrafo é aquele que tem uma vida intensa e interessante.Só assim, consegue conversar com a vida do biografado.
A função da arquitetura foi debatida pelo crítico de arquitetura americano Paul Goldberger e pelo premiado arquiteto português Eduardo Coutinho. Os processos e as intenções de uma obra não são tão importantes quanto o resultado final.Tiradas : “Muitas casas que entraram para a história da arquitetura nunca foram habitadas.” “Ninguém almoça embaixo de um manifesto”.Niemeyer ? O melhor e o pior na história da arquitetura brasileira. Fez com que o símbolo nacional fosse a arquitetura do século XX, Brasília, mas pôs sombra em muitos talentos e não avançou.Passou a fazer cópias de si mesmo.
A política foi o ponto forte da Flip 2013.Passeatas na rua, plateia agitada, debates sobre as passeatas.Gilberto Gil conversou com Marina de Mello e Souza sobre a defesa do patrimônio histórico e cultural de Paraty.Falou da necessidade de se achar um equilíbrio entre os interesses locais e os globais e que cabe às autoridades encontrar esse equilíbrio. Mas “o Estado deixou de representar o interesse público e passou a representar o interesse privado”.
A jornalista Eliane Cantanhede, Na Casa Folha, fez a defesa do lado bom e romântico de Brasília, que a imprensa geralmente ignora. Só a roubalheira vira notícia. Comentou a importância dos protestos, com a ressalva de que se o Brasil está nas ruas é porque melhorou.
Três mesas sobre as passeatas foram inseridas a toque de caixa na programação desse ano.A primeira – Narrar a rua – tratou da nova mídia das redes sociais responsável pela mobilização maciça nas ruas. Dela participou o produtor cultural Pablo Capilé, responsável pela criação do N.I.N.J.A ( Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação ) que com um laptop e outros aparelhos conectados ao iphone conseguiu cobrir as manifestações, de dentro das passeatas, com grande repercussão entre os jovens. A transmissão não faz filtro, não faz edição, o que levou a mesa ao questionamento do papel da imprensa tradicional durantes as passeatas. Junto com o diretor Marcus Faustini, Capilé criticou governos e a Polícia, provocando longos aplausos. O N.I.N.J.A é ligado a grupos militantes, a maioria do movimento Fora do Eixo, que promove músicos, bandas e debates.
A segunda mesa política – Da Arquibancada às ruas – lembrou a ideia fixa que o poder tem por grandes monumentos e estádios. O movimento Passe-livre , que é pequeno, mas antigo e persistente, percebeu que a máquina falsificada da democracia falhava e quando conseguiu amansar a Polícia, fez o movimento crescer.A mesa reuniu o filósofo Vladimir Safatle e o psicanalista Tales Ab’Saber que conectaram os eventos recentes a um momento internacional de questionamento da política e da democracia. Mais uma vez foi lembrada a falta de representatividade popular e que a violência da Polícia mostra o seu despreparo para a democracia.
Inflamada foi a plateia no terceiro debate sobre polícia que juntou o economista André Lara Resende e o filósofo Marcos Nobre Eles concordaram com a falta de representação política, mas discordaram sobre os motivos dos protestos.Para Lara Resende – a origem esteve no fato de o Estado sugar a renda nacional e não devolver em serviços de qualidade. Para Nobre, pelo peemedebismo, blindagem do sistema político contra as formas de transformação da sociedade. Acabou sobrando vaia para o mediador William Waack, representante da Rede Globo que não se furtou a defender sua posição: “movimentos sociais sem clara definição provocam menos mudança do que as esperanças despertam”.
De tudo o que ouvi sobre política, se existe consenso é na falta de representatividade do povo, que hoje quer bem-estar e respeito pela cidadania. Aprofundando a democracia, chegaremos a um novo modelo de sociedade.
Fecho o resumo com o homenageado Graciliano Ramos, cuja vida e obra era lembrada antes de cada palestra, o que me fez matar um pouco a saudade dos meus tempos de Letras na USP. Já tinha quase me esquecido do que constatei na época ao ler São Bernardo e Angústia, da sua ironia e da busca obsessiva pela concisão, pelo silêncio e pela do excesso. Foi clássico no sentido do rigor de linguagem e moderno, por ser provocativo e pouco harmonioso. Embora ateu, dizia que a Bíblia era o melhor livro que já tinha lido.
A infância de Graciliano foi marcada pelas agruras do sertão e desde cedo se libertou da repressão através dos livros que lia. Adulto, marcou seu trabalho na Prefeitura de Palmeira dos Indios pelo senso ético, pela coerência de princípios e pela honestidade. A Flip enfatizou que o legado de Graciliano foi o despertar do espírito crítico e que é preciso uma dose diária de Graciliano na comunicação de hoje.
Pincelei um pouco do que vi e ouvi nesses 4 dias de Flip. Lá, foi muita coisa, sempre corria de um lado para outro, com a sensação de que estava perdendo algo em alguma parte da Festa. Acho que faltou mais caipirinha na praia. Fica para o ano que vem.
A palavra chacina 07/05/2013
Posted by Maria Elisa Porchat in A Língua Portuguesa Adequada, Atualidades, Radiojornalismo.Tags: assassinatos múltiplos, carne salgada, chacim, massacre, reportagem policial
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Um dia, na redação da Rádio Bandeirantes, surgiu a dúvida: a partir de quantos assassinatos devemos usar chacina, palavra infelizmente frequente nas reportagens policiais. A resposta não veio dos livros, mas da Delegacia de Investigação de Homicídios Múltiplos, onde o termo é usado, a partir de três homicídios no mesmo local e hora.
Os numerais multiplicativos, pouco usados na linguagem informal, também aparecem para a caracterização dos assassinatos: homicídio duplo, triplo, quádruplo. Quando o número de mortes é grande usa-se matança, massacre, extermínio ou carnificina.
Quanto aos livros, eles trazem que chacina, num primeiro sentido significa carne suína salgada e cortada em postas, provavelmente com origem no latim vulgar. Chacim é um sinônimo antigo de porco.
Chacinar é preparar e salgar a carne. O segundo significado é assassinar mutilando e por extensão, matar três pessoas ou mais de uma só vez. Há quem use de modo figurado, expressando analisar minuciosamente algo, como um texto, da ortografia ao estilo.
Cada palavra provoca em nós um sentimento diferente. No caso de chacina, pavor e repugnância.
De qualquer forma, todo verbete merece nossa atenção e interesse, pela história que carrega e por suas acepções, até mesmo quando definem atos hediondos que gostaríamos de ver riscados definitivamente dos noticiários.
Recordação do Costa Concórdia 09/04/2013
Posted by Maria Elisa Porchat in Atualidades, Diversos.Tags: Cruzeiro, Linha Costa, naufrágio, passageiros aterrorizados, risco ao meio ambiente, Roberto Carlos
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Janeiro de 2010: minha irmã e eu, na excursão Emoções em Alto Mar do Roberto Carlos, a bordo do navio Costa Concórdia. Emoções, aliás, que começaram em maio, no Dia das Mães, quando as filhas me surpreenderam com dois bilhetes para o cruzeiro. As quatro noites superaram a animação dos meses de expectativa: shows de humor, o romantismo do Roberto Carlos, sambão da Beija-flor, caipirinhas, comida boa, amizades novas. O navio, um luxo. Como lembrança, levei a réplica do Costa Concórdia que está na estante da casa na praia.
Janeiro de 2012: o Costa Concórdia nos noticiários, depois de atingir uma rocha no Mediterrâneo, 30 pessoas mortas, duas desaparecidas. Cenas de terror dos passageiros, irresponsabilidade do capitão.
Eu me pus no lugar dos turistas aterrorizados. Pensei no prazer que, como eu, haviam sentido antes da viagem,, revi naquelas trágicas imagens o luxo do navio, as poltronas confortáveis,o casco gigantesco.
Mais de um ano se passou e o navio continua encalhado num parque marinho nacional, de recifes de coral protegido. Precisa ser removido da área, para ser desmontado, num plano que representa inúmeras dificuldades e um custo altíssimo. Desmontá-lo no local onde se encontra significa um prejuízo enorme para o meio ambiente local.
Acompanho as notícias do acidente do Costa Concórdia com consternação. Faço um esforço enorme para preservar na memória as alegrias e as emoções daquele janeiro de 2010, ao olhar a réplica do navio na minha estante.
Li recentemente 19/03/2013
Posted by Maria Elisa Porchat in Atualidades, Literatura.Tags: envelhecimento, Fazes-me Falta, Inês Pedrosa, Jane Fonda - O Melhor Momento, Raduan Nassar, Um Copo de Cólera
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Gostei, mas é preciso uma reserva de oxigênio para ler Um Copo de Cólera do Raduan Nassar. Cada capítulo tem um só período com um ponto final. Pensar que reclamávamos do Saramago! A narrativa acompanha em ritmo a explosão de fúria de um casal, depois de uma noite de sexo. Nassar usa uma linguagem contundente para narrar um conflito aparentemente banal, que chega a tornar a convivência insuportável. Atrás da guerra verbal, aparecem as contradições culturais, amorosas e subjetivas do casal.
Fazes-me Falta da jornalista Inês Pedrosa, autora que tive o privilégio de conhecer em Paraty, também exige disposição por parte do leitor, dada a complexidade do texto e do relacionamento mostrado. São monólogos alternados de uma morta e do companheiro, pensamentos profundos sobre afetos, morte e a dor da perda. Tocou-me especialmente este: “e deslizo para esta solidão demasiado humana de não poder voltar a ser sozinho, como era quando tu existias nesta mesma cidade, e eu já nem sequer pensava em ti”.
Jane Fonda – O Melhor Momento tem que estar na mesa de cabeceira de quem passou dos 60 e decidiu pendurar a chuteira. Em resumo, o seguinte: pare de lamentar a juventude perdida e assuma o comando para enfrentar bem as mudanças da idade e tirar proveito da vida nessa fase. São conselhos detalhados sobre saúde, estilo de vida, sentimentos, espiritualidade e autoconhecimento.